O Inverno teima em não nos deixar, mesmo quando o mercúrio dispara para os 30ºC lá fora. E a culpa é de Valter Lobo que, com o seu EP de estreia Inverno, nos traz algumas das canções mais bonitas da última estação. Uma beleza tão hipnótica e devastadora que nos atinge sem aviso como um murro seco no  estômago.

Quando há tanto para dizer e se caminha em cima de sonhos, a música e as palavras surgem naturalmente. São sons que se podem ouvir em paisagens bucólicas ou cidades vazias, com uma melancolia acentuada. Sons que se devem ouvir a sós do lado de dentro de uma janela embaciada. Ou com um amor verdadeiro. Sons de leve anestesia e esperança. Quem o diz é o próprio cantor.

Valter Lobo, natural do Norte de Portugal, não tem ainda 30 anos mas carrega em si todas as amarguras do mundo. Advogado de profissão, músico de sala-de-estar, lança-se agora no seu primeiro disco, uma colecção de 5 canções maravilhosamente tristes e nostálgicas intitulada de Inverno.

A fórmula não podia ser mais simples: uma guitarra e uma voz despida que põe tudo de si em cada palavra. Palavras que constroem histórias de escrita prodigiosa, que pautam todo o álbum, sobre o desencanto com o mundo e com os humanos. Um sentimento de eterna desilusão, de alguém que pensa que conseguirá mudar o mundo. Do caminho penoso e arriscado na busca da autenticidade e realização. O Inverno, esse, está sempre lá, cobrindo cada canção com o seu manto azul e implacável, relembrando com pingos grossos de chuva que o coração bate mais devagar quando está ferido.

“Eu não tenho quem me abrace neste Inverno”, o single inaugural disponível para download gratuito no site oficial do artista, é um tema emotivo e desarmante que procura o calor humano a todo o custo. Desamparo, solidão, saudade corroem a alma do cantor que lamenta “sinto a falta se ser um todo, sinto a falta de ter um rumo, sinto a falta de um lugar seguro, sinto a falta do teu sorriso”. Uma dor glaciar que parece queimar a pele e nos contorce por dentro. Afinal, quem não se sentiu assim pelo menos uma vez na vida?

“Raios de Luz” faz romper uma brisa de Verão no céu escuro que se abateu sobre nós com uma orquestração luminosa e um tom que voz que vislumbra o optimismo. O reluzir do olhar ganha aqui um poder redentor capaz de sarar mágoas. “Pensei que fosse fácil” surpreende-nos com uma suave batida tribal, num apelo sentido do trovador ao seu ‘coração frágil que tarda em levantar’, encaminhado por uma marcha de teclados ricos e sonhadores. “Canduras Agruras” volta a trazer o dedilhar confessional da guitarra , numa crítica de Lobo a uma sociedade cada vez mais alheada de si mesma, repleta de vidas que não se tocam, e às feridas que se ganham na tentativa de ser feliz. “Olha por mim” encerra esta magnífica colecção de canções frágeis, de emoções em carne viva que corroem a alma como traças na melhor peça de tecido.

A produção de José Duarte Antunes veste cada tema com finas texturas subtis que compõem o modelo na perfeição.

Valter Lobo – EP Inverno (8,5/10)

Download do single “Eu não tenho quem me abrace neste Inverno” disponível aqui e o álbum pode ser encomendado aqui.

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Pedro Lima

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