Ainda fazia sol quando Aloe Blacc pisou o palco principal que tinha sido ocupado por Bebe minutos antes. Partilhou a sua felicidade com o facto de haver tanta cara àquela hora, naquele final de tarde que até o Americano elogiou. O homem que tem feito as delícias dos fãs de Soul mais modernos, entrou com todo o seu swag e pinta desmesurada acompanhado por trompetista mais saxofonista e aqueceu a alma da comedida plateia que já tinha entrado no recinto. Numa toada sempre muito inspiradora e positiva, o músico foi comunicando frequentemente com a plateia, entreteu, divertiu e encantou todos os que compareceram. Apresentou o seu Good Things, tocou “Loving You Is Killing Me” (que foi precedido de uma pequena brincadeira lançada aos casalinhos) e continuou com o hit “I Need a Dollar”. Última música, um jam que acaba com uma saído em grande estilo pela lateral do palco, com o casaco pendurado nas costas e os sapatos brilhantes a andar e a deixar uma banda para trás a fazer mais dois ou três compassos antes do concerto acabar.
Seguiu-se Little Dragon, que até tinha estado a ver Aloe Blacc no meio da plateia enquanto enrolava uma erva. Japonesa que vive na Suécia e que encheu o palco secundário de temas que marcaram e têm marcado os tops mundiais. Ironia das ironias, desligam-se as luzes e o Palco EDP fica sem energia, enquanto estava a dar a “Ritual Union”. Segue o concerto, mais ritmado, com uma Yukimi Nagano a liderar banda numa fase de concerto que meteu pad’s de bateria coloridos e dança do teclista. Ponto alto do concerto para nós, a “Crystalfilm” e lá seguimos para o concerto da noite.
Sábado foi decididamente o dia com maior afluência de todo o Super Bock, e compôs-se graças a uma geração mais velha que veio de propósito para ver Peter Gabriel & The New Blood Orchestra, que preencheu o palco com mais de 50 músicos, prontos para interpretar os grandes temas do artista a solo. O concerto começou muito, muito morno, numa interpretação pesarosa e lenta de temas “Red Rain” ou “San Jacinto”. Houve tempo para Regina Spektor subir ao palco e interpretar “Après Moi”. Só com mais de 40 minutos de espectáculo é que o público foi animando e é já no encore que surge a “Don’t Give Up”, dando a sensação de missão cumprida, por parte do inglês.
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No palco secundário já uma grande audiência esperava por Annie Clark, mais conhecida por St. Vincent, votada há poucas semanas a mulher mais sexy do indie-rock pela revista NME. Entre o público ouviamos comentários da sua recente apresentação no Vodafone Mexefest no Porto. “Foi explosivo!”‘ diziam alguns. No entanto deparámo-nos com uma actuação morna, com a vocalista natural de Porland a demonstrar sinais visíveis de cansaço, com uma voz esforçada que nem a simpatia conseguiu esconder. Com uns calções curtinhos e a sua familiar guitarra, Clark abriu a noite com “Marrow”‘ do álbum de 2009, Actor, numa versão açucarada e tranquila, ao que se seguiu “Cheerleader” de Strange Mercy, que manteve o registo meloso e sedutor. Avançámos com “Chloe in the afternoon” e “Save Me From What I Want”‘ com acordes de guitarra dispersa, passinhos milimétricos de dança sobre saltos altos, tamboretes de marcha e a voz arrastada e sinuosa da cantora que fez lembrar a tempos, e para nosso espanto, temas como “Army of Me” ou “Hypperballad” da islandesa Bjork. Mas parecia que a calmia estava a terminar, pois com “Actor Out of Work”, “Surgeon”, “Nothern Lights” ou o mais conhecido single “Cruel” (com direito a explicação do vídeo), Clark presenteou-nos com guitarras arranhadas, percussão e teclas possuídas e algum head banging que pôs o público inerte a abanar o esqueleto. Tempo ainda no final para o grande momento da noite, com uma música a ser feita em modo crowd-surfing, num espectáculo visual digna de uma verdadeira estudante do rock. Muita coragem, já que não deve ter sido fácil como mulher (e centro de atenções). Aplaudimos e seguimos para o palco seguinte, para ver The Shins.
Foi injusto o papel que os The Shins têm, já que começam depois de Peter Gabriel, o grande responsável pelo maior número de pessoas neste último dia de Super Bock Super Rock. Graças à óbvia debandada do público mais velho, os Americanos estiveram a tocar para um grupo de pessoas bem pequeno. A juntar a isto, vêm apresentar o último álbum Port Of Morrow que tem pouco ou nada a ver com os antigos trabalhos da banda, muito porque do conjunto original, apenas o vocalista James Mercer resistiu. Para mais, Skrillex tinha sido mudado de palco e ainda havia muita criançada na fila da frente completamente distraída com esta súbita alteração. Ainda assim, o concerto foi agradável, mas sem dúvida que a falta de gente acaba por tornar a música já por si calminha e meio melancólica mais tristonha e cabisbaixa ainda. Momentos altos para “New Slang”, “Phantom Limb” e as mais recentes “Simple Song” (single que tem rodado imenso na rádio) e “September”. Já perto do final, ouvimos o vocalista dizer que se tinha divertido imenso ao passear pela capital (claramente mais esclarecido que Brandon Boyd, que agradeceu à cidade de Lisboa, como se tivesse a tocar no Pavilhão Atlântico) e a exclamar com alguma excitação “GOOD FOOD!”. Como te percebemos Mercer, como te percebemos. Também fez questão de agradecer às pessoas boas, mas isto é porque não estava a ouvir os descarados adeptos de Skrillex, que discutiam junto à grade quais eram as músicas que mais queriam ouvir.
Ainda se juntou uma grande moldura humana para ouvir Regina Spektor, mas o nosso instinto diz-nos que maior parte nem sabia quem ela era. Juntar os concertos da Russa com o de Skrillex é, no mínimo, estranho. Como tal, estivemos a assistir a um concerto de uma senhora ao piano que quase tinha de pedir desculpa às centenas de pessoas que falavam despreocupadamente por cima da música. Até parecia estar a ser agradável, a julgar pela pequena massa que ocupava a parte mais central e que lá ia aplaudindo a senhora que surgiu de preto e vermelho, nesta noite que ficou súbitamente gelada (os termómetros chegaram aos 10º). A muito conhecida “Fidelity” aqueceu e bem as mãos e corpos que já estavam a entrar em hipotermia e o sorriso aliado à voz doce da vocalista iam deliciando os fãs. Momentos altos ainda em “Us” e “Better”, neste concerto que apenas pecou pela falta de comunicação com o público, que parece ainda assim viver bem com isso.
Para o final da noite, o momento por que muitos esperavam. Durante a tarde a produção já tinha avisado que o concerto de Skrillex iria ser transferido do palco principal para o secundário (graças à imponente orquestra que acompanhou Peter Gabriel), que entopiu com tanta gente. O enérgico Sonny Moore encheu o recinto com a sua electrónica de garras afiadas, numa fórmula certeira que combinou samples do reggae, hip hop e pop, com baixos dubstep distorcidos, muito glitch, metal, modems em curto-circuito e uma componente gráfica que enche o olho de loops robóticos e ilustrações anime em explosões de cor que se agarram à retina. No público, muitas personagens metamorfoseadas pela histeria maximal e metalcore, de punho no ar e óculos de luzes neon. As orcas e crocodilos insufláveis que sacudiam no ar, assistiram a um set incendiário que recuperou temas de Scary Monsters and Nice Sprites ou do mais recente Bangarang, misturados com fragmentos de Rihanna, Ali Love, Bob Marley ou mesmo um muito aplaudido “Sabotage” dos Beastie Boys. O DJ norte-americano, ao contrário de grande parte dos DJ’s da tenda electrónica que insistiam em manter um look impenetrável e distante, atiçou a plateia do princípio ao fim com a sua voz de metaleiro, deixando no ar a mensagem para quem estivesse distraído: my name is Skrillex!
Texto: João Pacheco, Pedro Lima e Miguel Leite
Fotos: Dumitru Tira
