O terceiro e último dia do NOS Alive surgiu super solarengo. Provável consequência de ser sábado, o recinto cedo se compôs, com muitas t-shirts alusivas aos vários concertos do dia – passámos por fãs dos Smashing Pumpkins, IDLES, Thom Yorke e Bon Iver. Foi enorme a multidão que se dirigiu a Algés num dia que primou por simultaneamente apelar a diferentes tempos musicais: de um lado a energia rock’n’roll de Smashing Pumpkins e IDLES, de outro a sensibilidade extremada de Bon Iver e Thom Yorke.
O palco NOS foi inaugurado neste sábado pelos The Gift. Apesar de o seu trabalho mais recente ser Verão, a banda não se coibiu de passar por temas anteriores, nem de celebrar com “Primavera”. De facto, o concerto terminou com um momento intimista quando, apenas com um pequeno piano como instrumento, Sónia Tavares cantou a música literalmente numa clareira no meio do público.
Pela mesma hora, tocava no palco Sagres outra banda portuguesa: os recentes SOHO SOHO. A razão por detrás do nome nada tem a ver com Nova Iorque: “Soho é o Sonho que perdeu uma letra e converteu-se numa sonoridade que combina synth pop, dança e soul.” Ana Vieira é a voz aos comandos desta exploração de ritmos orgânicos, cantada em inglês, que reuniu algum público neste início de dia de festival.
Gavin James foi extremamente pontual para o seu concerto no palco Sagres. A fama de bom público persegue-nos, e Gavin não perdeu tempo a convidar-nos para cantarmos com ele. Pelo meio de algumas palavras que ensaiou em português, disse-nos que era irlandês (como se aquele cabelo ruivo enganasse), que tinha um português horrível e que nos amava. O público sabia as letras e acompanhou Gavin ao longo do concerto, celebrando ainda mais em músicas como “Tired”. No palco NOS começava entretanto Tom Walker, sequência natural para o público de Gavin James, que aqui encontrou mais um cativante músico proficiente em temas de amor. What a Time To Be Alive é o apropriado nome do seu trabalho de estreia, lançado em Março deste ano.

O registo das bandas até aqui não nos preparou para o terramoto que estava prestes a instalar-se no palco Sagres: patrocinado pelos IDLES. Perante as descrições que ouvimos do concerto no LAV (Lisboa Ao Vivo), em Novembro passado, era impensável perder esta oportunidade de assistir ao espectáculo da banda de Bristol. Ainda tocavam a primeira música quando o guitarrista se debruçou acentuadamente sobre o público – e, pouco tempo depois, a primeira fã já caía para o fosso entre o público e o palco, num crowdsurfing menos bem sucedido. Num misto de energia e loucura permanente, a banda está longe de viver de um elemento só. Todos saltam, todos gritam, quase todos correm o palco de lés a lés, irrequietos. O público deste concerto, que excedia largamente as dimensões da tenda, dividia-se em duas partes: a central, que estava em perfeita simbiose com a banda, e a periférica, estupefacta perante aquilo a que estava a assistir. Gostaríamos de lhe chamar uma celebração mais que justa do punk, mas sabemos que o vocalista, Joe Talbot, não iria aprovar.
Para quem prefere embalar as dores da alma com canções depressivas, em vez de as transpirar, começou entretanto o concerto de Bon Iver no palco NOS. É interessante perceber que já passaram mais de dez anos desde que Justin Vernon precisou de se isolar numa cabana isolada, para exorcizar os seus demónios na forma de For Emma, Forever Ago. Rapaz de muitos projectos musicais, desde os Volcano Choir a The Shouting Matches, Justin Vernon teve com Bon Iver a oportunidade de passar pelas quatro estações, conforme explicou na antevisão do seu próximo álbum, i,i, com lançamento agendado para 30 de Agosto – se o álbum de estreia foi o Inverno, Bon Iver, Bon Iver trouxe a Primavera, o experimentalmente festivo de 22, A Milion o Verão e aguardamos pacientemente o Outono. Podemos assim dizer que este concerto teve muitas músicas fora de tempo, mas que os momentos de Verão (como “8 (circle)”) resultaram melhor ao vivo do que esperávamos. “Skinny Love” chegou despida de artifícios, com os primeiros acordes tirados de uma singela guitarra, e teve concorrência em número de suspiros com “The Wolves”, e o seu hino desesperado what might have been lost. “Heavenly Father”, música que não pertence a nenhum dos álbuns, proporcionou também um momento de comunhão com o público muito bonito. Foi ímpar a hipnose que Justin Vernon conseguiu neste concerto de cerca de 90 minutos. “22 (OVER S∞∞N)”, pouco ironicamente, foi a música que o encerrou.
Se é facto que os Smashing Pumpkins lançaram há alguns meses um álbum novo, Shiny and Oh So Bright, e também que a banda recuperou recentemente alguns do membros da sua formação original, arriscamos dizer que a maioria do público que assistiu a este concerto procurava um alinhamento saudosista – e foi isso que a banda lhes ofereceu. Tratou-se duma viagem até aos anos 90 com alguns temas recentes. O cenário elaborado era constituído por três bonecos gigantes, lembrando um circo. Ainda antes do término deste concerto, era tempo de regressar ao palco secundário, para outra experiência transcendente.
Antes de mais, o palco Sagres fica tão bem a Thom Yorke. Munido de electrónica diversa e acompanhado por Nigel Godrich, este concerto foi surpreendente mesmo para quem tem como muito claro que Thom Yorke em nome próprio nada tem a ver com Radiohead. Muito mais que uma interpretação equivalente à do formato álbum, Thom apresentou reinterpretações dos temas de The Eraser, Tomorrow’s Modern Boxes e Anima e, também, de AMOK (dos também seus Atoms for Peace). Se as animações luminosas de Tarik Barri contribuíam, sem dúvida, para a alucinante viagem, o baixo exacerbado de Thom Yorke e a sua voz, sempre ao vivo, eram os principais responsáveis pela transformação a que assistíamos nas músicas, que se tornaram mais cruas, mais orgânicas. Enquanto saltava irrequieto de baixo para a mesa e da mesa para o baixo, Thom tinha oportunidade de dar piruetas, de gesticular para o público de ar tão caracteristicamente perdido, de nos mostrar quão adoravelmente inusitado é. Gostámos especialmente de temas como “Not The News” ou “Dawn Chorus” – este último ao piano, até então abandonado, a inaugurar o encore de forma intimista. Obrigada por teres partilhado esta viagem connosco, Thom Yorke.

O encerramento do palco NOS estava reservado para os Chemical Brothers. Produzindo ritmos vertiginosos que chegam a quase todos, Tom Rowlands e Ed Simons fizeram a festa com a multidão, indecisa entre seguir as animações dos ecrãs gigantes ou simplesmente agitar o corpo de forma inusitada. Ao palco Sagres subiu ainda a dupla francesa The Blaze. Apaixonados por cinema que são, inauguraram este concerto de apresentação de Dancehall com um par de telas que os ocultavam, onde projectaram um vídeo de alguns segundos, na tentativa de adensarem o suspense. Estas rapidamente se afastaram para revelarem a dupla e lançarem o mote para a dança de final de noite.
Findos os três dias de NOS Alive, o rescaldo é bastante positivo. Sentimos que o facto de o cartaz não ter tantos pesos pesados como em anos anteriores contribuiu para que outros artistas de nicho (qb) tivessem uma maior visibilidade, perante uma plateia que já deposita nesta organização o voto de confiança de comprar bilhetes com meses de antecedência, antes de a maioria dos nomes serem anunciados. No próximo ano, o festival acontecerá de 9 a 11 de Julho e os Da Weasel já estão confirmados para o último dia.
A nossa fotogaleria completa do 3° dia está aqui!
11/Julho | 12/Julho | 13/Julho
Texto: Andreia Duarte
Fotografia: Joana Viana