Os CELSO amanham-se na jovialidade que os define, não só pela recente ascensão do grupo a alguns dos mais badalados palcos lisboetas, mas também pela sobriedade que atingiram através da maturação artística de cada elemento.

Formados em 2017, em Benfica, como força natural da partilha no Externato Marista de Lisboa, Duarte Igreja (Guitarra), João Lima (Bateria), João Paixão (Guitarra e Voz), Martim Batista (Teclados) e Miguel Casquinho (Baixo), constituem a formação que tem abraçado um desenvolvimento impactante no meio do público mais atento aos novos valores da música portuguesa independente. A garra e autodeterminação que alimenta essa independência, que claramente os define, assume-se crucial naquela que é a primeira aventura disponível para todos os ouvintes, o EP Celso #1, obra editada em 2018, demarcando-se como prova viva do quanto “gostam de nadar contra o vento”; realiza a sua capacidade quase clínica de construir canções tão fortes e capazes de prender os ouvintes, tendo por facto a realidade de que esses mesmos temas (em jeito underground) permitiram que a banda tocasse grande parte dos concertos recorrendo à assertividade de “Brandão”, ao cambalear de “Ziguezé” e à simplicidade anti-vidaloca de “Domingo(s)”.

Celso #1 concentra-se na capacidade minimal de fazer boa música, sem recurso a grandes floreados ou a grandes produções, caminhando num percurso em que uma mistura simples e a animosidade inerente à enorme vontade de fazer (boa) música (contra tudo e contra todos), resultando numa excelente fórmula para a criação artística (sem grandes excessos ou luxos), concentrando-se na beleza que define o início de qualquer futuro supergrupo. No mesmo ano editam “Músicas de Inverno”, EP que tendo sido gravado na cave do café-restaurante “A Delícia” (espaço de ensaio e de criação da banda), é cunhado com solidão processual, tendo sido desenvolvido pelo coletivo em plena harmonia centralizada nos dias isolados de novembro. Os temas “Espanhola” e “Amanhecer” traduzem uma sonolência hipnotizante, transmitida através da passada dos sintetizadores, da vincada e pulsante linha de baixo, das guitarras ondulantes, das vozes profundas e sofridas, e da bateria (antagonicamente) enérgica e vigorosa.

Uma boa cama se preparou em 2018, para que em 2019 (num rasgo decisivo) o single “Tá Tudo Bem” viesse reservar um lugar para CELSO bem perto dos astros da primeira divisão do indie português. O tema conquistou o público português com a sua vibe dançante e a sua confiança animada e renovada, tendo o mesmo público sido premiado (no ano seguinte) com o EP ao vivo, “Queres é Conversa”, pelo qual a banda assume a posição de manter uma identidade, mas não sendo uma sonoridade repetitiva; é o caso de “Leiria” que assume uma estética que se aproxima do mais atiçado surf rock, ou “Marvila Drift” com uma postura endiabrada, provocadora e aliciante, ora não fosse o baixo de de Miguel Casquinho (neste mesmo tema) uma perturbante e a ameaçadora e encarceradora repetição, alumiada pelas guitarras palpitantes, até ao encerramento do instrumental, marca para a entrada da cavalgante “Lagartixa”, através do qual se destaca a mesma característica que ainda há pouco partilhei: o que é de CELSO, soa a CELSO, ainda que CELSO possa ser e fazer muitas coisas, tal como o prova em “BR4ND40”, que sai do mundo retro para a realidade dos ouvintes do trabalho de CELSO. É esta mesma identidade que pretendem transmitir, mas metamorfoseando-se em algo novo sem perder de vista o antigo que tem vindo a atrair um nicho de fãs dispostos e disponíveis para acarinhar o seu trabalho. É na calha desta vontade que “Queimar Tempo” e “Bate Papo” foram lançados este ano, como singles de apresentação do novo álbum que chega no final de 2021, “Não Se Brinca Com Coisas Sérias”; a maturidade, a qualidade da produção, o reflexo artístico assim como a reflexão da identidade de cada um dos elementos da banda permite-nos afirmar que há algo de novo no rosto de CELSO; talvez sejam menos borbulhas, mas mais cicatrizes, ora não fosse o crescimento uma dor constante.

É com a neo-folclórica abordagem de “Bate Papo” que concluímos que CELSO já não é menino da gala anual ou do concurso de talentos em que se toca tributo a AC/DC, Led Zeppelin, Hendrix ou Beatles; Celso é já digno de ter a sua própria gala e de receber o seu próprio culto, sendo razão de tributos vários, nem que seja pela disponibilidade de querer mudar o rumo dos miúdos do externato, ao inspirá-los a ambicionar o que ainda não foi ambicionado. O que é de CELSO a CELSO regressará; do que estão à espera para entregar o tributo devido, leitores?

Lécio Dias